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segunda-feira, 14 de novembro de 2011


O Tempo do Sapo ou da Cobra?
Thiago Godoy
Diário de Cuiabá, 07 de agosto de 2010
Entre os dias 2 e 6 de Agosto de 2010, Cuiabá e algumas cidades mato-grossenses testemunham um grande evento que abrilhantou ainda mais a região, o Fórum IEL de Gestão Empresarial. Um dos palestrantes foi o designer Hans Donner, que foi um excelente provocador de platéia, na minha opinião, com proporções imensuráveis.
A palestra seria um momento motivacional ou para conhecimento da história deste austro-germânico que chegou ao Brasil para ser o melhor designer do mundo (em suas próprias palavras), se não fosse o seu relógio. Isso mesmo. O relógio de Hans Donner mudou tudo em seu Fórum. O relógio em questão chama-se Timesion. Ele deveria ser apenas um novo produto marcador do tempo do designer! Mas não é.
Este que aqui escreve ficou tão impressionado que pronunciei, de ontem (04/07) até agora, milhares de vezes que Donner não está no tempo certo, ele não é de agora, mas está mais adiante que Singapura (o país mais adiantado do mundo, segundo o designer). Os filósofos sobre os quais estudei me deram várias horas de reflexão sobre o tempo (consumindo o meu), mas não me recordo algum que mexesse mais com meus conceitos como ocorreu diante do amante da (Glo)beleza.
O que é o tempo? É conceituação organizada de dados mensuráveis? É sequência? Jean Paul Sartre que me ajude! Porém, Hans Donner fez algo além disso: não conceituou o tempo, mas, ao apresentar seu Timesion, restaurou nossa mais primitiva noção de tempo. Explico.
O Timesion tem como mote principal o fato de que o tempo está inserido no ciclo do dia e da noite, coisa que todos os nossos antepassados já viveram antes de Santos Dummont. Até aí, nada de novidade. No entanto, é exatamente nesse fato que está a inovação. O tempo que conhecemos são números. O Timension não tem número, mas posição, assim como a forma empírica do tempo em nossa vida, pois, quando olhando a sucessão do dia e da noite, nós fazemos a experiência cíclica do tempo. Quando olhamos em nossos relógios, esse tempo não tem ciclo, mas sim saltos (dos ponteiros) ou números organizados numa lógica de convenção. Se eu estivesse numa sala de aula, o meu melhor estudante levantaria a mão e perguntaria “e daí? O que muda? Eu terei de acordar às seis da manhã do mesmo jeito e aguardaria o fim da aula com o mesmo ronco no estômago”.
Mesmo que ele tenha que fazer as mesmas coisas com o “relógio-sapo” (que tem os ponteiros que pulam) ou com o “relógio-cobra” (que percorre o ciclicamente o espaço) haveria uma nova maneira de rever o tempo, e digo rever porque seria um olhar antigo retomado no presente. O que quero dizer é que nós não mais temos um tempo como apontamento de qualidade dos dias, mas uma angustiante marcação fragmentada que nos dita os passos e amassos da vida.
O relógio-cobra não tirará, por ele, o estresse da consulta a que chego atrasado ou a reclamação do pouco tempo que tenho com minha namorada antes que alguém chegue; não perderei a vontade de elevar minha mão esquerda em direção ao queixo do desastrado atendente que me fez voltar em casa para uma troca de roupa encafezada! Porém, não mais terei 24 horas, mas terei um dia, não mais terei dez minutos para o fim da prova, mas terei a aproximação do fim.
O relógio-cobra é a recuperação da vivência, é a libertação das convenções perfuradas na história. Deixaríamos de brigar com o tempo, de lutar contra o fim do nosso tempo, e teríamos tempo para perder tempo e, depois encontrá-lo novamente. Não desejo ser portador de um dos oitocentos exemplares do Timenson ainda, esperarei 2014 para tê-lo, mas desde hoje quero ter tempo e não ser do tempo. Quero ter um sol que não me faça amargurar a espera do Epitáfio, mas um dia que me faça suar, correr e não me mate em vida!
Temos de recuperar nossa relação com o tempo, deixando a matemática opressora de lado. E, como dizia Berdiaeff, nosso valoroso tempo é o existencial que não se escraviza nos números, mas se deleita na história atravessando o Cronos sem se esvaziar e desumanizar.

Thiago Godoy é filósofo e educador

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