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terça-feira, 15 de novembro de 2011

Fechar as Portas*

Por múltiplas vezes ouvi amigos de meus pais usarem a frase: “em tal lugar há tanta paz que as casas não têm muros e dormem de portas abertas!” Sempre vinha à cabeça a ideia de pequeninas vilas e lugarejos que, de tão calmos, o vento violento era apenas brisa. No meu imaginário eu via uma casinha com janelas pintadas de azul desbotado e paredes brancas com rodapés dando contornos à fantasia. Éh! As portas abertas se traduzem para mim como lugar de paz.
Uma manhã dessas conversando com uma estudante de filosofia que ingressará no curso de Pedagogia ouvi dela a frase que atravessou minha imaginação. Ela disse que, com tanta violência acontecendo nos meios familiares, daqui a pouco os pais deverão trancar as portas dos quartos para não correr o risco de receber a visita da violência nas mãos de filhos que querem “herdar” as riquezas – como ilustram as principais manchetes jornalísticas nos últimos anos.
Bem, o que me leva a escrever não está no fato de ter ou não portas abertas ou contornos anis nas casas, mas no fato de que a violência que ronda e que “cresce em toda grande cidade” está cada vez mais próxima das pessoas, em nosso cotidiano. E sei que os fatores que provocam essa violência são os mais variados e combinados, impossíveis de se tratar em poucas linhas. Porém, pergunto-me todos os dias: aonde essa vida violenta terminará?
Nós precisamos abrir certas portas cerradas! Portas da paciência, da preocupação com o bem-estar dos outros, portas da gentileza, do sentido de solidariedade, que não precisa de tragédias para se mostrar. Também portas da lealdade e da constância que não necessitem de leis canonizadas para oferecer mais conforto à gente da “melhor idade” nos transportes públicos e filas de nossas cidades, por exemplo.
O fim da violência necessitará de muito mais que metáforas sobre portas. O fim da violência precisa de pessoas que lhe imponham limites. Não aprendi nos bancos escolares esta lição, mas sei que o passo necessário para contermos a onda de violência está no fato de impedir que nossa visão egoísta domine e, por outro lado, gerar ações altruístas.
Nossos conceitos não podem apenas se comover com animais ameaçados ou calamidades, precisamos gerar atitudes reais e cotidianas. Deixarmos o dia-a-dia ilustrado com legítimas ações como oferecermos acentos às pessoas idosas e gestantes; não acharmos que cinco minutos não significam nada a um cadeirante que tem vagas prioritárias nos estacionamentos; cessarmos de atribuir pecados aos outros; abandonarmos teorias que menosprezem a sexualidade humana, ou acreditarmos que apelidos sempre alegram seus portadores.
As portas deverão continuar trancadas para os que não possuem as chaves da liberdade, do limite, da ética e da solidariedade (que para mim significa sentir o que o outro sente), dentre tantas chaves desse molho necessário. Não quero propor um comunismo religioso ou metafísico, na verdade precisamos ampliar o conceito de social. Deixando que o indivíduo, peça chave na sociedade, se torne mais que uma parte do somatório, ou seja, a pessoa não é na sociedade um fragmento, mas é parte real do conjunto. E isso fará com que suas ações criem redes e não apenas sejam ações multiplicadas.
Devemos mudar o hoje para a conquista de um amanhã melhor. E essa mudança é gerada na cidadania que pode ter fonte em leis, mas apenas tem vida em nossas atitudes.

Publicado no Jornal Diario de Cuiabá

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