O que são Direitos Humanos? Essa
é uma excelente questão. Poderíamos começar dizendo que são direitos, por isso,
liberdades garantidas por sermos pessoas.
Refletir sobre a temática dos
Direitos Humanos é um caminho de grande qualidade, em especial, quando o que
está ao redor são movimentos que têm a intensão de desvalorização: como a não
aceitação das diferenças étnicas, sociais, culturais, religiosas ou sexuais. Na região de fronteira a discussão é ainda
mais enriquecedora por conter o que é essencial à temática: pessoas e
concepções variadas de culturas que avaliam a realidade.
A noção de Direitos Humanos está
intimamente ligada à dignidade da pessoa e, na atualidade, ainda se pode adicionar
a presença do Estado, ou seja, o poder público que deve exercer os seus
serviços às pessoas para que elas possam viver plenamente e com condições
essenciais para a qualidade de vida.
No entanto, refletir sobre o
conceito dos Direitos Humanos é caminho longo, porém, marcado por conquistas e
lutas iniciadas desde as primeiras civilizações, como o período de formação dos
primeiros governos, instituições políticas, ou seja, desde a criação do Estado
propriamente dito. Um dos principais momentos foi com Ciro, o Grande, no século
V a.C, quando conquistou a Babilônia e declarou livres os escravos e promulgou
a liberdade religiosa.
Na atualidade o Estado reconhece
que a pessoa, por assim o ser, tem direitos que lhe são fundamentais e que
impõe obrigatoriedade de obediência em cumprir tais diretrizes.
É necessário destacar que a
dignidade humana (ponto mais elevado do valor da pessoa) é propriedade que
jamais se perde, de modo lícito; mesmo se a pessoa estiver sem vida (cabe
lembrar o cuidado de nossas sociedades com a memória e o próprio corpo dos
falecidos). Essa noção de dignidade foi inaugurada pelo pensamento filosófico
cristão, em especial a partir de São Tomás de Aquino (1225 – 1274) que
desenvolveu de maneira mais completa a teoria da pessoa: “A pessoa é um ser
singular, completo, incomunicável e distinto de qualquer outro ser”. A
dignidade está na alma de todo pensamento da atualidade, como é na própria
Declaração Universal dos Direitos Humanos, com seus trinta artigos.
Voltando ao espaço fronteiriço
localizada entre Corumbá e Puerto Quijarro (Brasil e Bolívia) se poderia
destacar alguns pontos: há, mesmo com tanta proximidade física, uma grande distância
cultural entre brasileiros e bolivianos, esses últimos, muitas vezes vistos no
ponto mais baixo da verticalidade. Outro destaque é a falta de conhecimento e
valorização da história da constituição dessa região, já que há relatos da
presença espanhola antes mesmo da fixação portuguesa por aqui. Mas a principal
característica a se grifar é o fato de que se poderia aumentar a qualidade se
houvesse mais respeito e conhecimento da realidade dessa fronteira. Haveria
inclusive melhores condições para expansão das relações comerciais, para
destacar um dos pontos que mais se dá importância na atualidade, ou seja, se os
direitos humanos fossem guias das relações aqui estabelecidas, o intercâmbio
seria uma arma de fortificação da liderança local, um essencial componente no
desenvolvimento econômico.
Porém quando se trata de
direitos humanos na fronteira poderia se dar um olhar ainda mais qualificador:
o reconhecimento dos valores presentes nas pessoas, nas histórias e nas
realidades dessa região. Esse processo é muito mais além da cordialidade ou uso
de “adjetivos” na língua estrangeira (como o “nostros Hermanos”, muito presente
em discursos públicos); ele é a consciência da existência da via dupla, ou
seja, não é o Brasil o único lugar que oferece apoio, já que também o recebe, se for levado em conta que é
pela pequena ponte da fronteira que entra grande número de produtos que alimentam
as fábricas brasileiras, sem esquecer do gás que gera energia no território
nacional e intenso acesso a bens e serviços no comércio local brasileiro. E não
se pode esquecer a facilidade de consumos produtos importados pela sociedade
brasileira. No entanto, não é a economia a maior riqueza dessa região, mas a
própria cultura riquíssima aqui existente. Um exemplo é nem saber da existência
“De La Fiesta de los Muertos” muito celebrada na Bolívia que é vizinha e a
mesmo tempo haver toda as alfaias para o “Halloween” importando dos EUA, que
não se traduz ou interage com nenhuma expressão local, o que restringe ainda
mais a força cultural.
Revitalizar e criar a vivência
dos Direitos Humanos na região de Fronteira é ampliar os horizontes de
intercâmbio intelectual, turístico, econômico entre outros. Afinal a Aldeia
Global não pode ser utópica e ter apenas o Norte como acesso, há a necessidade
de novos caminhos de interação para qualificação das relações sociais e
humanas.
Viver efetivamente a dignidade
humana é negar o desnivelamento entre as pessoas, classificando os “bons” e as
“personas non grata”, por exemplo. Essa realidade toma vulto quando uma criança
tem vergonha de “hablar” diante dos demais que falam em português; quando o
cidadão não é respeitado por um funcionário público no atendimento; quando numa
fila o direito ao atendimento prioritário é condicionado à nacionalidade, entre
outras situações.
No processo de construção das
sociedades humanas, as relações positivas e marcadas pelo respeito à dignidade da
pessoa, permitiram evolução e conquistas de novos saberes, de alterações
estruturais, criação de esferas sociais, para que houvesse harmonia nas
relações com o meio e as pessoas.
A região de fronteira é
território rico em diversidade cultural. É nela que se encontra os limites
físicos do Brasil e da Bolívia e vai além da demarcação do fim das soberanias
nacionais. É nessa terra que se desenvolve uma cultura rica em expressões, numa
fusão criativa e ampla de relações expressas na língua, nas características
físicas, na sofisticada culinária, na arquitetura, nas vestimentas, na
estética, e em tantos outros aspectos da cultura.
Aqui é território de se viver a
força de sermos pessoas, de construirmos história e fazermos a diferença. A
natureza exuberante que partilhamos seria uma boa metáfora para nos inspirar: o
rio Paraguai que é tão precioso ao Brasil, tem no nome a internacionalidade, o
mesmo “serpenteador” do Pantanal está fertilizando as terras bolivianas e
construindo poesias, histórias e canções que colorem o dia a dia além da
fronteira, e nós não seguiremos nessa navegação rumo ao um oceano, que é sim, o
destino para novas e reais conquistas?