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quarta-feira, 2 de janeiro de 2019

Direitos Humanos na Fronteira


O que são Direitos Humanos? Essa é uma excelente questão. Poderíamos começar dizendo que são direitos, por isso, liberdades garantidas por sermos pessoas.
Refletir sobre a temática dos Direitos Humanos é um caminho de grande qualidade, em especial, quando o que está ao redor são movimentos que têm a intensão de desvalorização: como a não aceitação das diferenças étnicas, sociais, culturais, religiosas ou sexuais.  Na região de fronteira a discussão é ainda mais enriquecedora por conter o que é essencial à temática: pessoas e concepções variadas de culturas que avaliam a realidade.
A noção de Direitos Humanos está intimamente ligada à dignidade da pessoa e, na atualidade, ainda se pode adicionar a presença do Estado, ou seja, o poder público que deve exercer os seus serviços às pessoas para que elas possam viver plenamente e com condições essenciais para a qualidade de vida.
No entanto, refletir sobre o conceito dos Direitos Humanos é caminho longo, porém, marcado por conquistas e lutas iniciadas desde as primeiras civilizações, como o período de formação dos primeiros governos, instituições políticas, ou seja, desde a criação do Estado propriamente dito. Um dos principais momentos foi com Ciro, o Grande, no século V a.C, quando conquistou a Babilônia e declarou livres os escravos e promulgou a liberdade religiosa.
Na atualidade o Estado reconhece que a pessoa, por assim o ser, tem direitos que lhe são fundamentais e que impõe obrigatoriedade de obediência em cumprir tais diretrizes.
É necessário destacar que a dignidade humana (ponto mais elevado do valor da pessoa) é propriedade que jamais se perde, de modo lícito; mesmo se a pessoa estiver sem vida (cabe lembrar o cuidado de nossas sociedades com a memória e o próprio corpo dos falecidos). Essa noção de dignidade foi inaugurada pelo pensamento filosófico cristão, em especial a partir de São Tomás de Aquino (1225 – 1274) que desenvolveu de maneira mais completa a teoria da pessoa: “A pessoa é um ser singular, completo, incomunicável e distinto de qualquer outro ser”. A dignidade está na alma de todo pensamento da atualidade, como é na própria Declaração Universal dos Direitos Humanos, com seus trinta artigos.
Voltando ao espaço fronteiriço localizada entre Corumbá e Puerto Quijarro (Brasil e Bolívia) se poderia destacar alguns pontos: há, mesmo com tanta proximidade física, uma grande distância cultural entre brasileiros e bolivianos, esses últimos, muitas vezes vistos no ponto mais baixo da verticalidade. Outro destaque é a falta de conhecimento e valorização da história da constituição dessa região, já que há relatos da presença espanhola antes mesmo da fixação portuguesa por aqui. Mas a principal característica a se grifar é o fato de que se poderia aumentar a qualidade se houvesse mais respeito e conhecimento da realidade dessa fronteira. Haveria inclusive melhores condições para expansão das relações comerciais, para destacar um dos pontos que mais se dá importância na atualidade, ou seja, se os direitos humanos fossem guias das relações aqui estabelecidas, o intercâmbio seria uma arma de fortificação da liderança local, um essencial componente no desenvolvimento econômico.
Porém quando se trata de direitos humanos na fronteira poderia se dar um olhar ainda mais qualificador: o reconhecimento dos valores presentes nas pessoas, nas histórias e nas realidades dessa região. Esse processo é muito mais além da cordialidade ou uso de “adjetivos” na língua estrangeira (como o “nostros Hermanos”, muito presente em discursos públicos); ele é a consciência da existência da via dupla, ou seja, não é o Brasil o único lugar que oferece apoio, já que  também o recebe, se for levado em conta que é pela pequena ponte da fronteira que entra grande número de produtos que alimentam as fábricas brasileiras, sem esquecer do gás que gera energia no território nacional e intenso acesso a bens e serviços no comércio local brasileiro. E não se pode esquecer a facilidade de consumos produtos importados pela sociedade brasileira. No entanto, não é a economia a maior riqueza dessa região, mas a própria cultura riquíssima aqui existente. Um exemplo é nem saber da existência “De La Fiesta de los Muertos” muito celebrada na Bolívia que é vizinha e a mesmo tempo haver toda as alfaias para o “Halloween” importando dos EUA, que não se traduz ou interage com nenhuma expressão local, o que restringe ainda mais a força cultural.
Revitalizar e criar a vivência dos Direitos Humanos na região de Fronteira é ampliar os horizontes de intercâmbio intelectual, turístico, econômico entre outros. Afinal a Aldeia Global não pode ser utópica e ter apenas o Norte como acesso, há a necessidade de novos caminhos de interação para qualificação das relações sociais e humanas.
Viver efetivamente a dignidade humana é negar o desnivelamento entre as pessoas, classificando os “bons” e as “personas non grata”, por exemplo. Essa realidade toma vulto quando uma criança tem vergonha de “hablar” diante dos demais que falam em português; quando o cidadão não é respeitado por um funcionário público no atendimento; quando numa fila o direito ao atendimento prioritário é condicionado à nacionalidade, entre outras situações.
No processo de construção das sociedades humanas, as relações positivas e marcadas pelo respeito à dignidade da pessoa, permitiram evolução e conquistas de novos saberes, de alterações estruturais, criação de esferas sociais, para que houvesse harmonia nas relações com o meio e as pessoas.
A região de fronteira é território rico em diversidade cultural. É nela que se encontra os limites físicos do Brasil e da Bolívia e vai além da demarcação do fim das soberanias nacionais. É nessa terra que se desenvolve uma cultura rica em expressões, numa fusão criativa e ampla de relações expressas na língua, nas características físicas, na sofisticada culinária, na arquitetura, nas vestimentas, na estética, e em tantos outros aspectos da cultura.
Aqui é território de se viver a força de sermos pessoas, de construirmos história e fazermos a diferença. A natureza exuberante que partilhamos seria uma boa metáfora para nos inspirar: o rio Paraguai que é tão precioso ao Brasil, tem no nome a internacionalidade, o mesmo “serpenteador” do Pantanal está fertilizando as terras bolivianas e construindo poesias, histórias e canções que colorem o dia a dia além da fronteira, e nós não seguiremos nessa navegação rumo ao um oceano, que é sim, o destino para novas e reais conquistas?

sábado, 27 de agosto de 2016

Os Direitos de quem?

Há alguns dias venho refletindo, mais uma vez sobre umas ideias que tenho ouvido. Um jovem policial padeceu no exercício do seu emprego. Infortunadamente foi morto ao cumprir seu dever profissional. Outra vítima da violência ainda crescente e sem perspectiva de contenção na estrutura brasileira.

Numa possibilidade ímpar, ouvi muitas opiniões de colegas que usam as mesmas fardas. Um ponto chamou-me a atenção: a recorrente reclamação de que os direitos humanos não o são. Nem direitos e nem humanos. Tudo isso representado na péssima dicção “os direitos dos manos”. As expressões e as ideias foram, a meu ver, uma grande afronta aos meus ideais. É o que me moveu escrever.
Há na caminhada histórica um intenso ir e devir para os direitos humanos. A história deles em 2016 é uma longa e ardorosa caminhada que teve passos nas pegadas do código de Hamurabi, nas ascensões e quedas dos impérios romanos, persas, otomano, nas origens da ética cristã, nas fumaças das pólvoras lideradas e contra atacadas de Napoleão, nas expectativas nativas pós câmaras de gás nazistas, das duas Grandes Guerras. Enfim até chegar à declaração Universal dos Direitos Humanos, a mais atual proposta de revisão dos limites para a experiência humana. Mas afinal, de que seres estamos falando? Por que há “manos” não irmanados?
Não trato do mérito real ou imaginário da dignidade profissional de muitos jovens que empunham armas como ofício. Não me cabe possibilidade e me sobra incompetência para isso! No entanto, como meus pensamentos existem, posso expressá-los embasados na minha cosmovisão.
Voltando à estrutura proposta! A declaração Universal de Direitos Humanos não é um elenco de frases ou análises sociológicas encadeadas e apresentadas como motes sensacionalistas. É, antes de tudo, uma séria reflexão de a quantas andam o mundo! Um processo de olhar mais detalhado das principais componentes da dignidade humana.
Os movimentos sociais e de críticas que desencadeiam as solicitações de direitos em nossa sociedade tiveram grande crescimento e ampliação de qualidade, especialmente quando sensibilizaram a sociedade, o que permitiu mais leis, mais cobranças de direitos e condições que minimizem ou busque menos as desigualdades.  É esse o ponto nefrálgico, na minha opinião! O Estado está por detrás daquele profissional, é ele quem garante a representatividade ao identificar o “mike” e lhe fornecer a arma letal. Há nisso o risco da morte e do perigo limitador da vida. É claro que também se trata de uma vida e uma vida humana, ou seja, o policial também deve ser atendido pelos Direitos Humanos que lhe garantam a mesma dignidade de todos. No entanto, a falácia é de desqualificação do atendido: o criminoso. Que mesmo que ocupante da “zona” negativa da lei, é apesar de tudo, também é ser humano. Não! Isso não significa que ele tenha perdão tácito ou real dos crimes cometidos que os desqualificam quanto cidadão. Ele deve receber a sua pena, mas de forma condizente com a lei, que aliás, no Brasil não alega, nas situações de paz, a pena de morte. Ele paga pela sua condição cidadã, que é inferior ao esperado, mas ele não deixa de ser humano.
A minha reflexão não é uma justificativa em prol da qualidade gratuita destinada ao criminoso e da desqualificação do agente público de segurança. Mas o fato de que a falha não está nas organizações que desencadeiam as reflexões e os direitos para OS humanos.
Os direitos humanos buscam garantir os valores essenciais que nos permitem ser o que somos: pessoas. Os DH são embasados, entre tantas coisas, na Dignidade Humana e na Igualdade de Direito.
A máxima desprezível “Bandido bom é bandido morto!” é caduca porque bandido nunca é bom! E um “morto” nunca será um caminho legal para qualquer ser humano, criminoso ou vítima, em especial na atual legislação brasileira. A punição deve seguir a lei! E a lei tem seus limitadores, não por vontade do “assembleismo”, ou seja, o processo de mudança não é a simples maioria, mas é reflexão e coerência entre atos e opinião que se tornam leis e limites.
Com isso a morte de um agente público não tem mais qualidade por essa designação, mas é penosa porque é mais uma vítima da violência, é outra baixa alcançada pela incapacidade social, em especial da gestão pública e das causas sociais ineficientes que há em nosso País, de além de não ter caminhos reais de criação de cidadania, não é capaz de oferecer ressocialização.
É por demais triste e penoso a morte de um policial no cumprimento do seu dever, mas é ainda pior achar que sua função é fazer justiça por suas mãos e movido pela passion.
Somos HUMANOS e o somos não pelas dialéticas ou dicotomias sociais, somos em essência e de forma plena com nosso nascimento. Precisamos de uma cultura de direitos que será contributo para todos e não para alguns. É a via única da cidadania comprometida com a democracia, a justiça e a paz!






domingo, 9 de fevereiro de 2014

O Mergulho em Cristo

Ser católico indica um grande caminho de vida, uma descoberta de maneiras inovadoras de ver e rever a cultura, a convivência, o desejo...
Se manifestar como participante de uma comunidade de fé é mais que identidade ou referenciais, Jesus revelou algo inédito para a vivencia de todos, pois Ele revelou quem é Deus, que Ele é o nosso “Abbá” (nosso papaizinho), ou seja, temos um Deus que é próximo e íntimo de nossa vida.
Bem, isso não é novidade para ninguém que partilha a mesma fé que eu e um grande número de pessoas no mundo. É claro que sabemos que há problemas com os números reais dos que se dizem católicos, porém minha ideia nesse texto não é essa discussão. Indo diretamente ao assunto: esses dias vi, li e reli diversas manifestações que me chamaram a atenção. Eram frases ou slogans do tipo: “católico não assiste tal coisa”, “quem é católico não apoia beijo X”, “minha fé não permite dar audiência para Y” etc. Chamou a minha atenção de verdade!! E explico: essas manifestações, a meu ver, não refletem coerência com a fé que deveríamos viver quando a qualificamos como cristã católica. Como introduzi, Jesus é o grande revelador de nossa fé, Aquele que veio ao nosso mundo para trazer a compreensão do que realmente devemos ser.

A vida católica, ordinariamente nasce no “mergulho” (batismo, do grego βαπτισμω - baptismō), com ele evidenciamos nossa filiação divina e nossa participação na comunidade cristã. Bem, se estamos falando em mergulho, e cabe lembrar que o rito do batismo exige a visualização desse mergulho (mesmo “substituído” pela ablução = despejar a água na cabeça), o rito é revelador da essência! No batismo mergulhamos no Mistério da Ressurreição de Cristo. Depois dessa introdução catequética continuo a explicação do meu incomodo.
O que me chama atenção nessas manifestações não é o desejo de fidelidade à fé, pois os valores cristãos são claros e exigentes e não coabitam com “meias palavras” ou somos ou não somos. No entanto, essas frases mascaram um dos maiores e evidentes dom do amor de Deus para o ser humano: a liberdade! O amor é liberdade na vida e na relação entre Deus e a pessoa. É da vida de Jesus que tiro essa conclusão.
No evangelho segundo Mateus surge a classificação de Jesus como um pecador, pois ele “comendo e bebendo, e dizem: Eis aí um homem comilão e beberrão, amigo dos publicanos e pecadores.”
(Mt 11:19). Jesus ainda continua no versículo 24: “Eu vos digo, porém, que haverá menos rigor para os de Sodoma, no dia do juízo, do que para ti.
” Ou seja não é a fuga do mundo que nos faz mais próximo de Deus! É a vivencia NO mundo da experiência de Deus! Amigos e irmãos é completamente avesso a fé em Cristo fugir do mundo! Somos missionários desse e nesse mundo! Não somos artificiais a este mundo. Exatamente fazendo a ligação com nossa experiência do batismo: quando mergulhamos no Cristo, não há nada que nos tirará Dele! Nada, mas nada mesmo! Devemos sim cuidar e alimentar a nossa fé, mas NUNCA fugir da responsabilidade de vivermos nossa fé com liberdade e compromisso de evangelização! Com isso assistirmos, vivermos num mundo não é compromisso com o mundo! É compromisso com o Senhor da vida! Que fez tudo isso, que nos chama ao Seu amor!
Penso que Jesus fez a diferença frente ao proselitismo e hipocrisia religiosa quando diante da mulher adúltera pede para seguir a lei: “lance a pedra quem não tem pecado”. E ainda quando foi visto “em meio aos publicanos e pecadores”!(...)
Não podemos achar que o “protesto” de desligar televisor fará o “Amor ser amado”, antes de mais nada precisamos assumimos nossa missão: Anunciar Jesus que nos revelou o Pai. E sem esquecer ainda que “vim para os doentes e não para os sadio” Convido uma leitura a dois excelentes documentos: “Ética na Internet” (2002) e Novo millennio ineunte (2001)
Nós cristãos não podemos fechar os olhos e voltarmos as nossas costas! Não significa que devemos aceitar tudo sem questionar, repito, nossos valores [cristãos] são claros, mas para vivermos tais valores, precisamos estar na vida! E se formos “mergulhados” no Cristo, seremos fonte e transmissores Dele!


segunda-feira, 23 de setembro de 2013

E os discípulos de Emaús

Lc 24,13-35
De acordo com o autor do nosso texto, os dois homens dirigiam-se para uma aldeia chamada Emaús, a sessenta estádios de Jerusalém (cerca de 12 quilômetros). Uma localidade com esse nome, a essa distância de Jerusalém é, no entanto, desconhecida… Pensou-se que o texto poderia referir-se a Amwas, uma localidade situada a cerca de trinta quilômetros a oeste de Jerusalém (alguns manuscritos antigos não falam de sessenta estádios, mas de cento e sessenta estádios, o que nos colocaria no local certo); no entanto, parece ser uma distância excessiva para percorrer num dia, sem paragens e a conversar despreocupadamente. Os comentadores destacaram, muitas vezes, a intenção teológica deste relato. Que é que isto significa? Significa que não estamos diante de uma reportagem jornalística de uma viagem geográfica, mas de uma catequese sobre Jesus. O que interessa ao autor não é escrever um relato lógico e coerente (se Lucas estivesse preocupado com a lógica e com a coerência, teria mais cuidado com a situação geográfica de Emaús; e, certamente, explicaria melhor algumas incongruências do texto – nomeadamente porque é que estes discípulos partiram para a sua aldeia na manhã de Páscoa sem investigar os rumores de que o túmulo estava vazio e Jesus tinha ressuscitado). O que interessa ao autor é explicar aos cristãos para quem escreve – na década de 80 – como é que podem descobrir que Jesus está vivo e como podem fazer a experiência do encontro com Jesus ressuscitado. Trata-se, portanto, de uma página de catequese, mais do que a descrição fiel de acontecimentos concretos.

O mestre encontra dois andarilhos, indaga-os, ouve-os e lhes fala da Palavra...

Ao partir do pão eles o conheceram
“Não ardia o seu coração enquanto ele nos falava” – com essa frase Cléofas chama atenção de outro discípulo sobre o fato de perceber que era Jesus, como uma idéia de justificativa. Os três (Jesus, Cléofas e o discípulo não identificado) chegam, finalmente, a Emaús. Os discípulos continuam a não reconhecer Jesus, mas convidam-n’O a ficar com eles. Ele aceita e sentam-se à mesa. Enquanto comiam, Jesus ”tomou o pão, recitou a bênção, partiu-o e entregou-lho”. As palavras usadas por Lucas para descrever os gestos de Jesus evocam a celebração eucarística da Igreja primitiva. Dessa forma, Lucas recorda aos membros da sua comunidade que é possível encontrar Jesus vivo e ressuscitado – esse Jesus que por amor enfrentou a cruz, mas que continua a fazer- Se companheiro de caminhada dos homens nos caminhos da história – na celebração eucarística dominical: sempre que os irmãos se reúnem em nome de Jesus para ”partir o pão”, Jesus lá está, vivo e atuante, no meio deles.
A última cena da nossa história põe os discípulos a retomar o caminho, a regressar a Jerusalém e a anunciar aos irmãos que Jesus está, efetivamente, vivo. A catequese dizia que Ele estava vivo; mas no dia a dia de uma vida monótona, cansativa e cheia de dificuldades, era difícil fazer essa experiência. As testemunhas oculares de Jesus tinham já desaparecido e os acontecimentos da paixão, morte e ressurreição pareciam demasiado distantes, ilógicos e irreais. “Se Jesus ressuscitou e está vivo, como posso encontrá-lo? Onde e como posso fazer uma verdadeira experiência de encontro real com esse Jesus que a morte não conseguiu vencer? Porque é que Ele não aparece de forma gloriosa e não instaura um reino de glória e de poder, que nos faça triunfar definitivamente sobre os nossos adversários e detratores?” – perguntavam os crentes das comunidades lucanas.
É a isto que o catequista Lucas vai procurar responder. A sua mensagem dirige-se a esses crentes que caminham pela vida desanimados e sem rumo, cujos sonhos parecem desfazer-se ao encontro da realidade monótona e difícil do dia a dia.
A nossa narração apresenta o esquema litúrgico da celebração eucarística: a liturgia da Palavra (a ”explicação das Escrituras” – que permite aos discípulos entenderem a lógica do plano de Deus em relação a Jesus) e o ”partir do pão” (que faz com que os discípulos entrem em comunhão com Jesus, recebam d’Ele vida e que O reconheçam nesses gestos que são o ”memorial” do dom da vida e da entrega aos homens).
Há ainda uma última mensagem: depois de fazer a experiência do encontro com Cristo vivo e ressuscitado na celebração eucarística, cada crente é, implicitamente, convidado a voltar à estrada, a dirigir-se ao encontro dos irmãos e a testemunhar que Jesus está vivo e presente na história e na caminhada dos homens.

Hoje eu pergunto: você tem seu coração de que forma? Ele arde? Ele esfria? Os discípulos sentiam o coração ardendo, mas não permitiram a consciência. O texto parece fazer um contraponto entre razão e sentimento: antes a razão estava ofuscada, o que impediram de ver que era Jesus, depois o sentimento que não encontra acolhida e eles não reconhecem que Jesus é causador do fogo interior!
Jesus é reconhecido na partilha do pão!
A Eucaristia é fruto comunitário. A Eucaristia constitui um dos núcleos de nossa fé e da nossa esperança, onde vive e se experimenta a história da salvação e o nosso se faz presente de forma especíalíssima. Aí se alimenta a comunidade eclesial e missionária. Comendo o corpo e bebendo do sangue ela se torna corpo místico de Cristo.
Tomemos: 1Cor 11, 23-27 (relato mais antigo da eucaristia)
Jesus muitas vezes, jantou com os seus discípulos, nas caladas da noite, após as jornadas de trabalho cansativo e, tantas vezes, conflitos, no contato com o povo, anunciando-lhe o Reino de Deus, curando enfermos e discutindo com os seus inimigos. Eram momentos preciosos. Ao redor da mesa, a conversa, o comer, o beber, a retomada do dia e a coleta das impressões, dúvidas, alegria, descobertas e aprofundamento dos ensinamentos dados ao povo. Os discípulos se sentiam bem. Tanto assim que não abandonavam o mestre. Eram refeições religiosas. Tinham um pouco da antecipação do Reino. Refeições como pontos altos da convivência com Jesus. Havia sempre a bênção conforme o costume dos judeus. A última ceia de Jesus com os seus está relacionada com este contexto, como objetivo do anúncio do Reino.
Discípulos de Emaús, resumo das principais idéias do evangelho de Lucas e da sua perspectiva teológica. Lucas quer sublinhar a presença nova do ressuscitado, diferente da terrena e pré-pascal. Embora se trate do mesmo Jesus de Nazaré, agora sua presença é experimentável pela comunidade cristã em chaves novas: a proclamação da Palavra (24,32): a fração do piro (14,35). sem esquecera própria comunidade (quando voltam à comunidade de Jerusalém. encontram a experiência do seu testemunho sobre o Ressuscitado: 24, 33-34).
Na eucaristia celebramos o mistério pascal de Cristo. Pelos sinais do pão e do vinho fazemos o memorial desse mistério e, através dele, somos transportados para o evento fundador da história da salvação: a morte e ressurreição de Cristo, graças às quais participamos da vida trinitária.



quarta-feira, 10 de abril de 2013

O dia mais Feliz de minha vida



A vida é cheia de surpresa! Em cada momento descobrimos passos que nos levam além dos limites, por meio de nossas descobertas e nossas conquistas. E nessas descobertas criamos nossos meios de realizações que nos (pre)enchem de felicidade.
Desde pequeno ouvia o adágio popular: “um homem realizado é aquele que: planta uma árvore, escreve um livro e tem um filho”. E como mágica, esse pensamento acompanha como uma meta e um lembrete. Já colhi frutos da minha árvore! Já escrevi, então me faltava...
Ser feliz é muito mais que conquistar ou criar, ser feliz, para mim, é dar sentido ao que nos rodeiam. Isso me faz lembrar a história de Esmirnia, uma catadora de lixo que teve sua biografia filmada no documentário homônimo. Ela vivia em meio a lixos, bichos e devaneios e não demonstrava o menor ponto de felicidade, porém tudo isso sob os olhares exteriores. No entanto quando à personagem é dada a fala (quase onisciente) a contradição é revelada: mesmo imperceptível ao senso, era muito feliz, pois se sentia realizada, o que poderia questionar nossa classificação.
Penso isso quando me lembro da pergunta: qual foi o dia mais feliz da sua vida? Uma questão tão comum, mas com alta complexidade devido ao fato de que a vida sempre surpeende. No entanto hoje eu tenho o dia mais feliz da minha vida! E não num limite de 24 horas.


Quando vi a beleza que um filho nos dá, quando senti no colo o calor de um abraço, mesmo que involuntário, mas que se traduz em afago e de necessidade de defesa e proteção. Meu dia feliz está marcado com o nascimento de meu filho, e na significação de todos os outros dias posteriores a este. Nada em minha vida permaneceu igual, aliás, quase nada, pois meu nome e minha identidade ainda são os mesmos.  Mas meu sorriso mudou, meu cansaço, minha alegria, meus caprichos, minhas energias e tantas coisas mais.
Meu dia mais feliz se transformou em DIAS sucessivos, sinto a mesma magia a cada amanhecer, a cada fralda trocada, a cada gesto novo que tentamos adivinhar! O dia mais feliz de minha vida é renovado a cada ciclo e ainda me pergunto se é o dia “mais” ou se já não foi superado pelo instante seguinte. Continuo achando que felicidade é construção, é variante, mas já sinto que onde estou hoje nunca estive e minha felicidade, pode ser maior, mas nunca foi como é! Obrigado, é o que sei dizer e o que posso sentir!
O dia mais feliz de minha vida é o meu hoje com aquele que veio há 30 “ontens” atrás, e ficou perene nos dias seguintes.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Um no outro (História nas Histórias)


É a vida, é mesmo um mistério! Seja por óculos religiosos, culturais ou mesmo antropológicos. Nada tira a sua força e muito menos sua marcação na história.
Hoje quero descrever ou escrever sobre essa vida! Essa vida que invade dias da história sem deixar de expressar o menor medo ou qualquer sentimento limitador. E nesse processo uma história é invadida por tantas histórias ou até histórias que são invadidas por outra história unificadora!
Minha história é construída a cada dia de capítulos, que muitas vezes, são tão surpreendentes que até parecem tiradas de muitas telas de sétima arte! E outras vezes nem estrelariam na Sessão da Tarde! Porém sempre, de um e de outro jeito, são componentes de única história que realmente me importa: a minha (longe de ser egoísta, apenas para confirmar a univocidade).
Como pode ser tão maravilhosa essa relação de histórias que se emaranham? São situações inusitadas, planejadas, complicadas, arrumadas, bagunçadas e tantas “adas” que poderiam completar a lista. Comigo não é diferente!! Sonhos que se encontram, desejos que despertam, ações que brotam sem a menor complicação, já em outras são mais complexas que cadeias de DNA. Nessas relações a trama da vida é confeccionada.
O que me deixa com mais atenção nesse fato, alem do processo em si, é quão grande valor a vida têm ao se misturar. Como a vida se enriquece com essas relações. Nunca imaginei descobrir tantas coisas nas contradições e adições de outras vidas! Como um beijo tem tanto valor? Como um toque pode despertar tantas sensações? Como um sussurro pode ser tão bem ouvido? Como rotinas podem valer muito mais que fatos inéditos? São contradições que se completam! Enquanto planos, estratégias, passos ou dados cartesianos não alcançam sempre o resultado esperado, há sempre uma possibilidade de derrota! Não que o acaso realmente exista, mas a vida é um mistério, e por isso deve gostar do mistério, daquilo que não é esperado ou sem valor!
É assim que vivo! É assim que faço felicidade, é assim que se faz vida!

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Educação sob olhares Cegos




Ao longo da história, a educação sempre se pautou em processos que lhe deram um caráter evolutivo ou de mudança. Em todos os tempos ela foi marcada pelas interferências da história, da cultura, da cosmovisão e de outros fatores. O que, podemos assim dizer, rendeu-lhe intensa riqueza e grande evolução.
Por meio de destaques de cenas e fatos do filme Vermelho com o Céu[1] quero fazer alguns cortes e comentar fatos que me revelam percepções da educação e a sociedade.
No presente filme, gostaria de comentar alguns fatores que me destacam nessa observação da concepção de educação e desmembrar em outros assuntos corelacionados.
Na realidade destacada no filme “Vermelho Como o Céu” quero avultar primeiramente a concepção de educação que subjaz em todas as relações desenvolvida no filme.
A história está vestida da década de 70, com uma Europa marcada ainda pela Guerra Fria, mas um período de intensas descobertas e novidades, além de grande contestações sociais. Isso destaca o fato de que, a educação já é vista como processo redentor (o que não é novidade em todas as sociedades advindas de períodos de necessidades, especialmente pós-guerras e revoluções). Essa é a Itália dos tempos de Vermelho como o Céu.
Quando o jovem Mirco, que perde sua visão num acidente doméstico,  é levado para escola, Instituto Cassoni, é recebido num meio tecnocrata, onde a função da educação é apenas treinar os estudantes – deficientes visuais –  para faculdades fabris e processos voltados a produção para a sociedade, algo que Paulo Freire chama de “Educação Bancária”, no caso do Instituto Cassoni essa estruturação era ainda marcada pela intensa rigidez disciplinar. Como versa Figueiredo:
Embora essas disciplinas reduzam em muito efetivamente o campo de exercício das subjetividades privadas, impondo padrões e controles muito fortes às condutas, à imaginação, aos sentimentos, aos desejos e às emoções individuais, faz parte de seu modo de funcionamento dissimular-se, esconder-se, deixando-nos crer que somos cada vez mais livres, profundos e singulares. (FIGUEIREDO & SANTI, 2007, p. 20)[2]

A estruturação rígida e voltada para a produção com certeza desenvolve uma visão obtusa e irreal da vida, já que a deficiência visual não é barreira intransponível, como revela-nos o próprio Mirco em sua história. O motivo da ida do jovem para uma escola especialmente elaborada para deficientes visuais é obrigatória por força de lei, que impedia que a escola convencional matriculassem-o.
O filme é ainda mais marcante por ser baseado em fatos reais. O que muda o eixo proposto no Instituto é o protagonismo de um professor, por sinal sacerdote, que percebe fatos idiossincráticos no jovem estudante. É ele quem permite que a criatividade e os anseios de Mirco pudessem aflorar, quando lhe revela o mundo criativo do cinema. É pelo mesmo professor que a ideia de Mirco, Felice e da pequena Francesca toma corpo e desvela a força da conquista de um sonho.
Enlaçando a ideia de uma educação redentora, quero exprimir o fato de que todo processo educacional, de per si, não é protagonista, mas antes, pode até contribuir para criação de miopia. Porém quando a educação se torna processo de desencadeamento de talentos, de animação (no sentido etimológico: a alma) ela ascende às novas perspectivas na vida das pessoas envolvidas, porém o caminho inverso pode acontecer se não for levado em conta que todo processo social envolve pessoas, suas particularidades e expressões internas e externas.
Outro fio condutor expresso no filme, que gostaria de destacar é em relação à sexualidade. Na história, Fracesca aparece como braço direito do protagonista, e se torna, por suas palavras: “fidanzata” (namorada) de Mirco.
A amizade infantil é acompanhada pela descoberta do outro que é masculino, este também se revela frente à moçoila que num primeiro momento aparece em meio a chacotas e proibições de relação.
O romance infantil não é precoce e nem fora da realidade dos protagonistas. Francesca descobre em Mirco a expressão de amor pela admiração, especialmente por, pelo que parece, ter encontrado um sonhador tão quanto ela. Já que pelo fato de ser filha de uma das colaboradoras da escola, tinha sua vida reduzida pela privacidade e a negativa de contato com os estudantes, pelo fato de serem meninos.
Francesca sonha ao lado de Mirco e revela-lhe os caminhos que permitiram que o mesmo descobrisse esse mundo desde muito cedo almejado, já que nas primeiras cenas, num diálogo com o pai, o jovem exprimia sua vontade de ter uma televisão. Esse encontro, com certeza foi motriz no despertar do jovem. Ela – de um lado com toda castração social da separação dos sexos, da distancia quase zoológica dos deficientes visuais e da dura disciplina desenvolvida pela mãe que não permitia o relacionamento com os estudantes, por medo de perder o emprego – foi descobrindo seus sonhos e anseios. Faço um destaque nessa relação: ela com a visão perfeita descobre, por meio do fascínio de Mirco, a beleza do cinema pelos sons. E lembrando que é ela quem revela o cinema ao jovem. Como se a história fosse um pouco irônica!
Assim como a educação e a severa disciplina marcam a vida do Instituto, a sexualidade é balizada pelas regras sociais. Basta que para isso se perceba a forma de primeira aproximação que Francesca realiza em Mirco: zombeteira e distante. E ainda a forma com que a mãe intervém, numa das cenas, na filha que está ao lado dos demais “atores mirins” e o diretor flagra-os.
Tanto a educação de cunho redentor tecnocrata quanto a segregação sexual marcam o fato de que é na sociedade que se forma o indivíduo. Essa expectativa de que a redenção ou a harmonia social seja adquirida pela pessoa é um passo errôneo, inclusive descrito por James Mill e questionado por Durkheim (1965:27).
Acredito que a crítica de Durkheim é amplamente aproveitada na realidade filmografada, já que a finalidade do Instituto era atender a harmonização social desses representantes, e não desenvolve-los em suas diversas potencialidades. Mesmo que o referido autor descreva a educação sob a finalidade social, é sabido que a pessoa é criativa e proporciona novas formas de vivencias de fatos repetidos.



Referências:

Filme Rosso come Il Cielo di Cristiano Bortone, Itália: 2004

DURKHEIM, Emile. Educação e Sociologia São Paulo: Hebra 2010 [1965]

FIGUEIREDO, Luís Cláudio M & SANTI, Pedro Luiz Ribeiro de. Psicologia uma (nova) introdução: uma visão histórica da psicologia como ciência. São Paulo, Editora Puc, 2007.

http://www.webartigos.com/artigos/vermelho-como-o-ceu-sociabilidade-e-subjetividade-o-individuo-transpondo-os-limites-sociais/11293/ acessado dia 24 de outubro de 2012



[1] Cristiano Bortone, Itália: 2004
 [2] Apud. http://www.webartigos.com/artigos/vermelho-como-o-ceu-sociabilidade-e-subjetividade-o-individuo-transpondo-os-limites-sociais/11293/ acessado dia 24 de outubro de 2012